Investidores de sucesso: Peter Lynch (2)

Investidores de sucesso: Peter Lynch (2)

por Marco Goulart

 

Este artigo apresenta um resumo das idéias de Peter Lynch em One Up On Wall Strett, e procura relacionar estas idéias com casos brasileiros. Esta é a segunda parte de uma série de três artigos. Neste artigo falaremos sobre a busca por ações vencedoras.

Para Lynch o melhor lugar para se encontrar uma ação vencedora é próximo a nossa própria casa. Devemos procurar empresas nas quais seja possível um acesso mais próximo, de forma que tenhamos uma vantagem de informação em relação ao analista comum que, em geral, está mais distante da empresa. Uma boa sugestão é “olhe para as empresas do seu Estado, da sua Cidade, e se houver alguma, do seu bairro”.

“Talvez um investimento vencedor pareça tão improvável a primeira vista que a maioria das pessoas imaginam que as possibilidades de sucesso estão muito além de qualquer probabilidade”. Isso faz com que um doutor que possua conhecimento apurado do mercado de medicamentos se sinta mais confortável investindo em uma empresa de petróleo da qual ele não entende absolutamente nada; enquanto os gestores da empresa de óleo investem em uma empresa que não possui relação com o setor no qual detêm expertise. Você não precisa ser um expert em petróleo para ver suas ações subirem, mas o fato é que o conhecedor do mercado de petróleo, em média, está em melhor posição que o médico para decidir quando comprar ou vender uma empresa deste setor. Você é médico? Existem algumas empresas do setor de saúde na BOVESPA, Odontoprev, Medial Saúde e DASA por exemplo. Você não acha que pode avaliar melhor estas empresas do que uma pessoa que não trabalha na área?

“A pessoa com a vantagem do conhecimento e informação sempre estará em vantagem em relação a uma pessoa que não detém o conhecimento.”

Lynch exemplifica com seu próprio caso. Ele possuía uma vantagem de informação em relação ao setor em que atuava (Setor financeiro). Apesar de não poder investir na sua própria empresa (Fidelity) ele era capaz de entender muito bem o que acontecia em outras empresas do setor. Foi o caso da Dreyfus (que multiplicou seu capital em 100x em 9 anos – 100 bagger), da Franklin (138 bagger). Ele observava que os lucros estavam crescendo e conhecia o negócio o suficiente para identificar estes negócios como grandes oportunidades.

“Investir sem conhecer o negócio é como jogar poker sem olhar para as cartas que estão na mesa. Por alguma razão o negócio de analisar ações tem sido algo tão esotérico e técnico que muitos investidores caem na armadilha de basear todas as suas decisões em sugestões de analistas.” As pessoas passam mais tempo analisando o melhor negócio na hora de comprar uma nova TV mas não pensam sequer por uma hora se a ação que estão comprando é realmente uma boa escolha.

Outro fator importante é o tamanho da empresa. Este fator tem uma enorme relação com o que se pode esperar de uma ação. Grandes empresas não costumam ter grandes variações nas suas ações. Em certas condições as grandes empresas podem dar um bom resultado, mas o grande retorno está nas empresas pequenas. Não há como esperar dobrar o capital comprando ações de uma gigante como a Coca-Cola. No caso do Brasil, é difícil pensar como a Vale pode dobrar ou triplicar de tamanho.

Lynch classifica as empresas em seis categorias:

 

As de Crescimento Lento (Slow Growers) – cujos lucros estão crescendo na mesma proporção que a economia, cerca de 2-4% por ano; Neste caso Lynch cita como exemplos as empresas do setor de energia elétrica, mas no Brasil é difícil encontrar uma empresa deste setor que tenha um histórico de crescimento de 2-4% ao ano por um longo período, ou que tenha crescido de forma semelhante ao PIB do Brasil.

 

As Robustas (Stalwarts) – boas companhias com lucros sólidos por ação crescendo cerca de 10-12% ao ano; Neste item Lynch cita como exemplos Coca-Cola, Procter & Gamble, e empresas de telefonia.  

  

As de Crescimento Rápido (Fast Growers) – companhias pequenas, agressivas e novas, crescendo de 20-25%, ou mais. Estas são as empresas que Lynch dedicava mais tempo de análise e procura. No Brasil este item poderia ser exemplificado pelo setor de Construção Civil, no que se refere à novas empresas. Este setor foi o que mais cresceu em número de empresas negociadas na BOVESPA antes da crise, no entanto poucas empresas do setor de construção apresentam um longo histórico de resultados.  Um bom exemplo de Fast Grower foi o caso da WEG, que por muitos anos cresceu lucros em torno de 30% a.a.

 

As Cíclicas (Cyclicals) – aquelas empresas cujos lucros sobem e descem quando a economia se expande ou se retrai; Neste caso pode-se dizer que o movimento cíclico de grande parte das empresas negociadas na BOVESPA deve-se em à fatores externos e flutuação cambial, vide problemas passados de endividamento em moeda estrangeira em empresas de setores como siderurgia e têxtil.

 

As Companhias em Mudanças (Turnarounds) – companhias com lucros temporariamente deprimidos, mas com boas perspectivas de recuperação; Neste item podemos encontrar empresas com lucros deprimidos ou até mesmo aquelas empresas que estavam em situação negativa. Lynch destaca também os casos de empresas que diversificam mal suas operações (fusões e aquisições que não agregam valor) e depois se vêem obrigadas a voltar atrás (o termo utilizado por Lynch é diworsification).

 

As Companhias Ricas em Ativos (Asset Plays) – companhias cujas ações valem menos que seus ativos, desde que seus ativos possam ser vendidos pelo menos por seu valor patrimonial. Na queda ocorrida na crise de 2008 vimos essa situação em empresas EzTec e Banco Alfa, chegaram a ser negociadas por 50% do valor patrimonial.

 

Vale ressaltar que esta classificação não é permanente, por exemplo, uma empresa de crescimento rápido pode se tornar uma empresa robusta ou turnaround. Para Lynch basear a estratégia de investimentos em “máximas” como venda quando dobrar o capital, venda após dois anos, ou corte as perdas vendendo após uma queda de 10% é absolutamente inútil, pois é impossível encontrar uma fórmula genérica que se aplique a todas as diferentes categorias de empresas.

Montar o “caso” (falaremos mais sobre o caso adiante) da empresa é muito mais simples se você consegue entender os conceitos básicos do negócio. É por isso que Lynch prefere investir em empresas mais simples ao invés de empresas complexas: “Prefiro investir em fabricas de roupas intimas do que em satélites de comunicação”. Quanto mais simples melhor, aponta Lynch. Quando alguém argumenta que “Qualquer um pode gerir este negócio” Lynch considera isto um plus, já que mais cedo ou mais tarde uma pessoa menos competente provavelmente vai gerenciar o negócio.

““Qualquer um pode gerir este negócio” é uma característica da companhia perfeita, o tipo de ação com que eu sonho”. Lynch destaca, além deste, outros atributos de uma empresa perfeita:

Tem um nome simples, ou melhor ainda, que não chama atenção– Manny, Moe, Jack, Consolidated Rock, são exemplos de empresas que Lynch admirava por possuírem um nome muito comum ou que não chamava a atenção. A idéia de Lynch é que ninguém se interessa por estas empresas, simplesmente porque não possuem um nome atraente. A falta de interesse da maioria das pessoas faz com que as grandes oportunidades se concentrem nestas empresas. (recomendo a leitura do nosso artigo “mera exposição”)

Produz ou faz algo trivial – Além de ter um nome simples, a empresa perfeita deve produzir algo simples. Lynch cita como exemplo o caso da Crown, Cork, and Seal, empresa que produz latas e garrafas. No Brasil temos o caso da Randon, produtora de implementos para transporte. Certamente é um modelo de negócio mais fácil de compreender do que o modelo de uma empresa maior ou mais complexa.

Faz algo “desagradável” – Nos Estados Unidos existem funerárias que possuem ações negociadas em bolsa, um bom exemplo para este item.

É um spinoff – Spinoff é uma empresa criada a partir da cisão de um negócio, empresas que surgem com a divisão de um negócio em duas ou mais partes. São poucos os casos de spinoff em bolsa no Brasil.

Investidores institucionais não possuem ações da empresa, e analistas não fazem a cobertura das ações – Observando a composição acionária da empresa é possível verificar se algum investidor institucional possui participação. Lendo relatórios de analistas podemos verificar quais são as empresas mais acompanhadas. No Brasil, em geral, somente as empresas que compõem o IBovespa são acompanhadas por mais de 5 casas de análise, e a grande maioria das empresas não é acompanhada por analistas. Lynch afirma que quando visitava uma empresa e descobria que o ultimo analista havia passado por lá há mais de três anos ele mal podia conter o entusiasmo.

Existem rumores sobre a empresa: Está envolvida com a máfia ou lixo tóxico – Alguém se arrisca a achar uma empresa deste tipo no Brasil? Naturalmente só será uma boa alternativa caso fique comprovado futuramente que não há tal condição. Mas as ações das empresas podem oscilar significativamente devido somente as notícias, e não fatos comprovados.

Há algo “deprimente” sobre a empresa – O melhor exemplo nos Estados Unidos é a Service Corporation International, empresa que presta serviços funerários, realiza enterros, entre outros.

Esta em uma indústria que não cresce – Muitas pessoas preferem investir em indústrias/setores de alto crescimento, onde há muita competição. Peter Lynch prefere investir em indústrias de baixo crescimento, isto porque para cada novo produto em uma indústria de alto crescimento existem uma série de pesquisadores tentando descobrir como produzir o mesmo produto de forma mais barata. Assim que uma empresa de software desenvolve a melhor planilha de cálculo do mundo, 10 outras empresas gastam 100 milhões para desenvolver um produto melhor. Isto não acontece com empresas que estão em setores de baixo crescimento.

Possui um nicho de mercado – Empresas que possuem uma vantagem muito específica, como por exemplo, a pedreira de uma cidade. Para moradores locais sempre será mais vantajoso comprar material desta pedreira do que da pedreira da cidade vizinha, devido aos custos de transporte. Aqui no Brasil temos um caso de nicho na Unipar (produtos químicos). Devido a periculosidade do produto vendido, por força de lei, há um raio limitado para o transporte do mesmo.

As pessoas precisam continuar comprando o produto – Laminas de barbear, remédios, são produtos consumidos diversas vezes pela mesma pessoa. Uma empresa que produz algo que só vai ser consumido uma única vez por alguém terá de desenvolver novos produtos constantemente.

É usuária de tecnologia – Lynch prefere investir em empresas que se beneficiam de avanços tecnológicos do que em empresas de tecnologia. Uma empresa de processamento de dados, por exemplo, se beneficia do aumento constante da velocidade dos processadores.

Pessoas da própria empresa estão comprando ações, ou a empresa está recomprando ações – Se funcionários da própria empresa estão comprando ações é uma sinal de que a empresa está indo bem, recompras de ações também podem ser um indicativo de boas perspectivas por parte da gestão.

 

Lynch procura evitar algumas características em empresas: diversificação que não agrega valor; empresas dependentes de poucos compradores; empresas com nomes excitantes. No Brasil um bom exemplo de nome excitante foi a OGX, empresa que fez um grande IPO.

Para evitar entrar em uma empresa que não irá trazer bons retornos Lynch costuma dar ênfase a análise dos lucros da empresa. Para Lynch, analisar ações de uma empresa com base em lucros e ativos não é diferente da análise de um investimento em uma drogaria, apartamento, posto de gasolina. Mesmo assim “é fácil esquecer que uma ação não é um ticket de loteria, mas sim a propriedade de parte de um negócio”.

Lynch destaca a análise do índice Preço/Lucro (P/L), obtido através da divisão de Preço da ação por Lucro por Ação. Um P/L baixo pode indicar que uma determinada empresa esta sendo negociada com desconto no mercado. Vale lembrar que os valores de P/L tendem a ser mais baixos para empresas de crescimento lento e maiores para empresas de crescimento acelerado, com as empresas cíclicas entre estes dois valores. Lynch coloca que alguns caçadores de barganhas acreditam que comprando qualquer ação com um baixo P/L obterão um excelente retorno. “Esta estratégia não faz sentido, não podemos comparar maças com laranjas.” Os valores de P/L devem ser analisados de acordo com a classificação setorial das empresas, e a situação (conforme grupos descritos anteriormente).

“Existem cinco maneiras de uma empresa aumentar seus lucros: reduzir custos, elevar preços, revitalizar-se, expandir para novos mercados, vender mais produtos para mercados que já existem, ou eliminar uma operação que traz prejuízos. Estes são os fatores a serem investigados na hora de elaborar “o caso”.

O “caso” nada mais é do que a elaboração de argumentos que possam levar a empresa em vista a aumentar os lucros. Após descobrir com que tipo de empresa você esta lidando, o índice P/L oferece uma noção se esta empresa está sendo negociada acima ou abaixo de seu real valor (valor intrínseco) considerando as informações recentes.

O próximo passo da análise é aprender o máximo possível a respeito da empresa com o objetivo de entender o que a empresa pode fazer e esta fazendo para trazer a prosperidade esperada, em outras palavras, fatores que irão promover o crescimento. Se for uma empresa de crescimento rápido, por exemplo, deve-se perguntar: como e onde a empresa pode manter as atuais taxas de crescimento? Para obter estas informações Lynch sugere a leitura dos relatórios anuais das empresas e demonstrativos contábeis, contatos com departamento de relações com investidores e se possível visita à sede da empresa. Lynch destaca que todas as informações importantes estão disponíveis para o investidor comum: “Não consigo imaginar qualquer informação importante que o investidor amador não possa descobrir por conta própria”.

O “caso” deve ser algo simples e conciso. Você deve ser capaz de explicar ao seu vizinho ou amigo, em poucos minutos, a sua tese de investimento. A partir daí é necessário verificar como o “caso” está desenrolando, à medida que a empresa divulgar novas informações e resultados (ex: trimestralmente).

Lynch enfatiza ainda diversos outros indicadores necessários ao conhecimento da situação da empresa, além de demonstrar na prática como se portar, e que tipo de perguntas fazer ao departamento de relações com investidores ou agente de investimentos.

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